Resistentes, mas pouco…

Notícias Opinião

Por José António Meneses, Especialista em Segurança / Director de Segurança e Vice-presidente da Associação de Directores de Segurança de Portugal

Nos últimos tempos, muito se tem falado, justamente, dos Resistentes que têm de manter serviços essenciais disponíveis e, desta forma, minimizar os efeitos desta hecatombe que nos caiu em cima.

Eles são os profissionais de saúde que “cerraram fileiras” contra este inimigo público invisível. Eles são as Forças e Serviços de Segurança que se, por um lado, têm de continuar a fazer o seu trabalho do dia-a-dia, uma vez que o bandido não faz quarentena, por outro, têm de garantir que nós, Portugueses, cumpramos o que foi definido para o estado de emergência e não nos andemos a contagiar uns aos outros, como se concordássemos com a opinião de dois ou três líderes políticos mentecaptos que nos entram pela televisão dentro, desafiando cientistas e especialistas no tema. Portanto, curvo-me perante as Forças e Serviços de Segurança que colocam, como tem sido seu hábito, a sua vida em risco para nos proteger, desta vez, de nós próprios, o que acredito ser muito difícil.

Reconhece-se, também, as associações e corporações de bombeiros por todo o apoio prestado à população, bem como às IPSS’s e alguns privados por ajudarem e apoiarem aqueles que mais necessitam. Tudo justíssimo!

Depois aparecem como resistentes colaboradores de alguns serviços essenciais, cuja actividade tem de continuar operacional, no sentido de satisfazer necessidades essenciais de todos nós. Em relação a isto, há uma ou outra insígnia que parece que quer realçar mais a marca do que o trabalho desempenhado pelo Resistente, mas pronto, aceita-se!

Agora, em relação aos profissionais da segurança privada que permitem que, em muitos desses locais, incluindo hospitais e outras infra-estruturas críticas, como transportes, estão na linha da frente permitindo que os Resistentes consigam realizar, sem reservas e focados, as suas tarefas, sem terem de se preocupar com o cumprimento de outras imposições da declaração de estado de emergência, como, por exemplo, com o controlo de lotação e a garantia de distanciamentos entre pessoas dentro de alguns
espaços, quem é que se preocupa com eles?

Tirando Sua Excelência o Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, seguramente por proposta do Director do Departamento de Segurança Privada, veio enaltecer a importância destes profissionais neste contexto, facto que reconheço como sendo de extrema importância e relevância para o sector, perante o qual me curvo e que, inclusive, teve reconhecimento no exterior! 1

Sem prejuízo, quem mais se refere a estes profissionais neste contexto? Há alguma referência por parte daqueles que têm responsabilidade política neste sector?

Por exemplo, alguns líderes políticos Europeus, nomeadamente a Primeira-Ministra Belga, agradece a todos os que já referimos mais os profissionais de segurança privada 2 .

Por exemplo a comissão europeia considera esta actividade essencial, cujos profissionais não devem ter quaisquer restrições à sua deslocação. 3

Aliás, a Polícia de Segurança Pública, através do departamento de segurança privada, veio corroborar este apelo da CE e esclarecer que não existe qualquer obrigatoriedade legal na emissão de declarações para que os seguranças privados se desloquem para os serviços, bastando, para qualquer eventualidade, que mostrem o seu cartão profissional, podendo ser inclusivamente requisitados para prestar auxilio às Forças e Serviços de Segurança, ao abrigo do dever de colaboração, daí não entender uma alegada proposta noticiada num órgão de comunicação social, feita por uma associação do sector, à tutela.

Em Portugal, nem na nota informativa da DGS – 009/2020, que agora já recomenda o uso de máscaras para algumas actividades e locais, recomenda o uso para estes profissionais que, como muito bem sabemos,
maioria das vezes, não conseguem manter a distância recomendada, fruto da missão que lhes é confiada, em regime de complementaridade das Forças e Serviços de Segurança.

De Sua Excelência o MAI, que agradece a toda a gente e deseja as melhoras de determinados profissionais, em relação a estes, nada! Nem um Secretário de Estado dá uma palavrinha de incentivo! Fala-se nos contaminados naqueles sectores que estão na linha da frente, no entanto, sabe-se quantos profissionais no sector da segurança privada é que foram contaminados, no âmbito das suas funções?

Continuando com algumas declarações que li, por parte de uma associação do sector, a um órgão de comunicação social a falarem do impacto económico que o COVID-19 tem nas empresas de segurança, nomeadamente que têm de recorrer ao lay-off. É verdade, é um facto compreensível e preocupante!

Agora, e o impacto que tem nos profissionais do sector, que provavelmente alguns vão perder o emprego? Consequentemente, qual será o impacto que tem na segurança pública e no tal sentimento de segurança colectiva?

Continuo sem perceber porque é que estas associações que têm “tempo de antena”, não tendem a puxar mais pelo inestimável contributo que estes profissionais dão para o sentimento de segurança pública, adoptando uma visão quase que exclusivamente economicista do problema.

Vejo referências a que o crime vai aumentar por via do COVID-19, contudo, dá-se a entender que é fruto da redução da actividade dos transportes de valores, inclusive responsabilizando o banco de Portugal por recomendar o uso de pagamento de meios electrónicos, como se este fosse o verdadeiro problema da generalidade das empresas de segurança privada, uma vez que, de acordo com o Relatório Anual de Segurança Privada de 2017, de entre 131 alvarás, só havia quatro para esta actividade. Acredito que seja mais um problema para uma ou outra empresa, mas seguramente que não será o problema principal para o sector e/ou para os profissionais que neles se integram.

O impacto é muito maior na área da vigilância, uma vez que grandes consumidores deste serviço estão encerrados, nomeadamente hotéis e centros comerciais e outros com actividade bastante reduzida, como tribunais, portos e aeroportos, etc.

Novos tempos, obrigam a novos desafios e há que pensar fora da caixa, no sentido de nos readaptarmos, contudo, a prioridade deve ser a protecção do emprego, bem como do apoio e acarinhamento dos seus principais activos, que são as pessoas.

Por fim, em relação àqueles que têm responsabilidades na definição e implementação de estratégias de segurança nas suas empresas que, neste contexto, tornam-se planos de contingência que os responsáveis políticos estão sempre a referir que as empresas têm de ter para situações como estas, nomeadamente para protecção dos seus colaboradores e clientes; àqueles a quem a Lei lhes atribui, para as entidades que são obrigadas a adoptar medidas especiais de segurança, particulares e especiais responsabilidades neste sentido, ou seja aos Directores de Segurança, nem uma palavra!

No entanto, imaginemos se acontecesse numa destas insígnias, com alguma dimensão, um foco de infecção com um elevado número de contaminados, entre clientes e colaboradores, lá surgiam vozes a criticar as medidas
de segurança implementadas e/ou a falta delas. Seguramente que aí, tal como infelizmente se passa com os lares, passava a estar no discurso político.

Finalizando, eu trabalho com muitos destes profissionais, que estão na linha da frente, que, aparentemente, não são “Resistentes”, mas digo-vos, mal de muitas instituições se eles não estivessem lá, muitas vezes a dar a cara por duas instituições/empresas e bem sei a dificuldade que têm em cumprir a sua missão num contexto como este, levando-os, por vezes, ao desespero! Como todos nós, também têm medo! Também têm família! Só precisam de um pouco mais de carinho e reconhecimento! A todos, um grande bem hajam!

1 https://coess.org/newsroom.php?news=COVID-19-Private-Security-between-public-recognition-and-neglection
2 https://www.linkedin.com/posts/coess-confederation-of-european-security-services_covid19-privatesecurity-
essentialservices-activity-6651362501961228288-93k-
3 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52020XC0330(03)&from=EN