Ferramentas tecnológicas de controlo de trabalhador são proibidas

Notícias Segurança no Trabalho

As soluções tecnológicas para controlo à distância do desempenho do trabalhador não são admitidas, diz Comissão Nacional de Protecção de Dados. As orientações são dadas pela CNPD de modo a garantir a conformidade dos tratamentos de dados pessoais dos trabalhadores com o regime jurídico de protecção de dados e minimizar o impacto sobre a privacidade em regime de teletrabalho.

Na sequência da pandemia decorrente do novo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença Covid-19 e das medidas de confinamento e isolamento social, o recurso ao teletrabalho generalizou-se. É neste âmbito que têm chegado à Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) várias questões relacionadas com o controlo, quer dos tempos de trabalho, quer da actividade laboral prestada em regime de teletrabalho a partir do
domicílio do trabalhador.

De entre as medidas excepcionais e temporárias relativas à situação epidemiológica, o Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, veio alargar, durante a sua vigência, regime de prestação subordinada de teletrabalho.

Neste contexto, e no exercício das suas atribuições e competências, a CNPD define, de forma sucinta, orientações de modo a garantir a conformidade dos tratamentos de dados pessoais dos trabalhadores com o regime jurídico de protecção de dados e minimizar o impacto sobre a privacidade em regime de teletrabalho.

Em circunstâncias normais, os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação utilizados pelo trabalhador em teletrabalho pertencem ao empregador:
. Quando seja este o caso, os trabalhadores devem observar as regras
de utilização e funcionamento dos instrumentos de trabalho que lhe forem disponibilizados, só podendo, salvo acordo em contrário, utilizá-los para a prestação de trabalho.

Contudo, dada a excepcionalidade da actual situação e a impossibilidade de as entidades empregadoras se terem dotado em tempo de recursos tecnológicos para disponibilizar à generalidade dos seus trabalhadores, frequentemente os meios utilizados são privados, o que impõe maior cautela na imposição de algumas medidas.

Naturalmente que, independentemente da propriedade dos instrumentos de trabalho, no regime de teletrabalho o empregador mantém os poderes de direcção e de controlo da execução da prestação laboral.

No entanto, neste regime não existe qualquer disposição legal que regule o controlo à distância, pelo que a regra geral de proibição de utilização de meios de vigilância à distância, com a finalidade de controlar o desempenho profissional do trabalhador, é plenamente aplicável à realidade de teletrabalho.

Aliás, à mesma conclusão sempre se chegaria pela aplicação dos princípios da proporcionalidade e da minimização dos dados pessoais, uma vez que a utilização de tais meios implica uma restrição desnecessária e seguramente excessiva da vida privada do trabalhador.

Por esta razão, soluções tecnológicas para controlo à distância do desempenho do trabalhador não são admitidas. São disso exemplo os softwares que, para além do rastreamento do tempo de trabalho e de inactividade, registam as páginas de Internet visitadas, a localização do terminal em tempo real, as utilizações dos dispositivos periféricos (ratos e teclados), fazem captura de imagem do ambiente de trabalho, observam e registam quando se inicia o acesso a uma aplicação, controlam o documento em que se está a trabalhar e registam o respectivo tempo gasto em cada tarefa (v.g., TimeDoctor, Hubstaff, Timing, ManicTime, TimeCamp, Toggl, Harvest).

Ferramentas deste tipo recolhem manifestamente em excesso dados pessoais dos trabalhadores, promovendo o controlo do trabalho num grau muito mais detalhado do que aquele que pode ser legitimamente realizado no contexto da sua prestação nas instalações da entidade empregadora. E a circunstância de o trabalho estar a ser prestado a partir do domicílio não justifica uma maior restrição da esfera jurídica dos trabalhadores.

Nessa medida, a recolha e o subsequente tratamento daqueles dados violam o princípio da minimização dos dados pessoais.


Do mesmo modo, não é admissível impor ao trabalhador que mantenha a câmara de vídeo permanentemente ligada, nem, em princípio, será de admitir a possibilidade de gravação de teleconferências entre o empregador (ou dirigentes) e os trabalhadores


Apesar da inadmissibilidade da utilização de tais ferramentas, reafirma-se que o empregador mantém o poder de controlar a actividade do trabalhador, o que poderá fazer, designadamente, fixando objectivos, criando obrigações de reporte com a periodicidade que entenda, marcando reuniões em teleconferência.

Situação diversa é a necessidade de registo de tempos de trabalho, que pode ser efectuado por recurso a soluções tecnológicas específicas neste regime de teletrabalho.
Tais soluções devem limitar-se a reproduzir o registo efectuado quando o trabalho é prestado nas instalações da entidade empregadora (i.e., registar o início e fim da actividade laboral e pausa para almoço).

Portanto, estas ferramentas devem estar desenhadas de acordo com os princípios da privacidade desde a concepção e por defeito, não recolhendo mais informação do que a necessária para a prossecução daquela
finalidade.
Não dispondo de tais ferramentas, excepcionalmente é legitimo ao empregador fixar a obrigação de envio de email, SMS ou qualquer outro modo similar que lhe permita, para além de controlar a disponibilidade do trabalhador e os tempos de trabalho, demonstrar que não foram ultrapassados os tempos máximos de trabalho permitidos por lei.

Do mesmo modo, nada impede que este controlo da disponibilidade do trabalhador e do cumprimento dos tempos de trabalho se faça por via de contacto telefónico ou electrónico por parte do empregador.