Acidentes de Trabalho: que causas – Que medidas de prevenção? – Que estado da arte?

Opinião Segurança no Trabalho

Por A.Costa Tavares *

Falarmos de acidentes de trabalho é abordarmos determinadas situações, supostamente disfuncionais, que podem ter inúmeras causas (dificilmente identificamos apenas uma causa). Algumas de origem complexa, cujas fronteiras não são diretamente visíveis, podendo ser originadas por falhas organizacionais (e aí estamos indubitavelmente a falar do modelo de gestão), falhas técnicas e mecânicas (relacionadas com equipamentos, máquinas e ferramentas de trabalho), falhas humanas (negligencia, a imperícia, a imprudência, a pressa em terminar algo entre outras) e falhas ambientais (mais relacionadas com as condições externas mas que influem direta ou indiretamente na relação entre o homem e o local de trabalho).

Vamos, então, abordar estas quatro fases indissociáveis, apostando numa abordagem pedagógica e simplista para não profissionais e/ou técnicos especialistas destas matérias da segurança e saúde e/ou gestão de recursos humanos.

No que concerne às falhas organizacionais (relacionadas com a gestão da entidade empregadora), que no nosso entender são as que maioritariamente contribuem para um clima organizacional alicerçado no risco, temos entre vários exemplos (análise não exaustiva):

  1. Ausência de formação profissional, nomeadamente a nível de trabalhos que envolvem riscos especiais e perigosos;
  2. Ausência de um plano de gestão de recursos humanos interligado com a segurança e saúde no trabalho envolvendo outros profissionais, nomeadamente nas áreas da medicina do trabalho, enfermagem ocupacional, psicologia organizacional e clínica, serviço social entre outras áreas pluridisciplinares das ciências sociais;
  3. Falta de comunicação clara e de objetivos exequíveis e tangíveis;
  4. Ausência de uma supervisão assertiva, nomeadamente no controlo de proximidade de atividades de riscos profissional;
  5. Layouts de trabalho pouco ergonómicos;
  6. Locais de trabalho congestionados e/ou desarrumados que contribuem para quedas de nível e de níveis diferentes;
  7. Pouca participação dos trabalhadores nos desígnios da organização;
  8. Trabalho repetitivo e monótono levando à perda de níveis de atenção e concentração.

A nível das falhas técnicas e mecânica (relacionadas com o uso de equipamentos, ferramentas e outros utensílios de trabalho) temos a evidenciar como fontes potenciais de inconformidade:

  1. Ausência de um plano de monitorização e verificação periódica dos equipamentos de trabalho;
  2. Remodelação do parque oficinal dotando-o de meios mais adequados, ergonómicos e funcionais;
  3. Consignação das máquinas e equipamentos de trabalho;
  4. Falta de proteção coletiva das máquinas e equipamentos (evitando a dispersão de gases, poeiras, ruído, vibrações, radiações e afins).

No que concerne às falhas humanas, e aqui temos que ressalvar que muitas falhas são cometidas por pessoas com cargos de relevância na organização (omissão ou por ação) não imputáveis aos trabalhadores como muitos as utilizam exonerando-se das suas responsabilidades de gestão e/ou coordenação, temos a referir não exaustivamente:

  1. Ingestão de bebidas alcoólicas e/ou ingestão de fármacos não controlados posteriormente pelos serviços de medicina ocupacional, cujos efeitos nocivos se podem presumir como causa de muitos incidentes e/ou acidentes;
  2. Trabalhadores com estados de hipoglicémia (nomeadamente no início do período de trabalho) que podem conduzir a quadros de lipotimia (desmaios) por ausência de nutrientes;
  3. Adoção de comportamentos compulsivos e aditivos como o excesso de cafeína, nicotina, fármacos podendo em último estádio de descompensação adotar o uso e abuso de tóxicos bem como outras ações colaterais como o acesso exacerbado às novas tecnologias perdendo momentaneamente os níveis de concentração desejáveis à operação que estão a realizar;
  4. Desmotivação por desempenharem uma função pouco estimulante, socialmente degradante e/ou estarem sujeitos a ritmos de pressão constante e simultaneamente desempenharem funções de risco elevado;
  5. Exposição a situações de stress constante (problemas familiares, exaustão profissional, alterações emocionais, assédio moral, problemas de saúde, neuroticismo e outros estados depressivos não devidamente acompanhados;
  6. Trabalho noturno e subsequente alteração dos quadros cronobiológicos que afetam a saúde mental, biológica, psicológica e fisiológica não esquecendo também a questão social e familiar do trabalhador na sua interligação com a família e os amigos;
  7. Situações afetas à personalidade do trabalhador como a imprudência (situações irrefletidas intempestivamente) precipitando os seus atos e conduzindo a quadros de sinistralidade; a negligência (em que o trabalhador omite ou age de forma voluntária sem a perceção real da ação que está efetivamente a cometer descurando o princípio de diligência ou de cuidado, quer consigo, quer com os colegas e principalmente quando tem a responsabilidade de coordenar e/ou chefiar outros) e a imperícia em que o trabalhador sente que não tem conhecimentos adequados para determinada função e a executa confiando nos seus desígnio, na sorte que tudo correrá da melhor forma.

Finalmente, as questões de foro ambiental/externo em que o trabalhador é surpreendido por uma situação de incêndios/explosão súbita, por um sismo ou uma inundação atípica ou outra (veja o exemplo de La Palma) em que o contexto muda drasticamente.

Excecionando esta última premissa, podemos efetivamente fazer algo na gestão da segurança e saúde no trabalho?

Como podemos melhorar o estado da arte?

Podíamos escrever linhas e linhas, refletindo inúmeras ações de controlo, mitigação e prevenção. Não vamos perder-nos em abstrações, mas sim com ações mais concretas, algumas conforme abaixo explicamos:

  • Apostando no desenvolvimento, crescimento e motivação dos trabalhadores, por vezes, com atos tão simples como “parabéns, o seu trabalho contribuiu para o sucesso da organização” ou “parabéns, está muito bem, mas sabemos que tem potencial para fazer mais e melhor e conte connosco para tal”;
  • Apostar na colaboração mútua entre trabalhador e organização, ouvindo-o, aceitando racionalmente as suas sugestões, críticas e problemas e tentando resolver internamente em conjunto;
  • Chamar os trabalhadores a colaborarem nos objetivos da organização, desde os mais simples (linha de produção) até aos que se posicionam em patamares de maior complexidade (sistemas de gestão comercial, recursos humanos ou financeiros) pois todos têm uma palavra a dizer se a gestão de topo e a gestão intermédia contarem verdadeiramente e genuinamente com eles;
  • Criar um clima organizacional de partilha, de liderança situacional (cada caso é um caso), de porta aberta, agilizando o processo comunicacional pois suaviza e que maneira as interações pretendidas e necessárias ao sucesso da organização.

Abaixo deixamos um modelo em que elencamos um conjunto de ações interdisciplinares que, no nosso entender, contribuem para ajudar a perceber como se pode efetivamente criar um clima organizacional mais são, mais participativo, mais envolvedor, mais motivador, mais resiliente e mais produtivo.

“Quando trabalhamos com algo que gostamos, dedicamo-nos mais e melhoramos o nosso desempenho. Por isso, concentre-se em encontrar o trabalho que o faz feliz” – Steve Jobs

A. Costa Tavares

Técnico Superior de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho

Docente, formador e consultor em matéria de SST e Gestão de Recursos Humanos e Psicologia do Trabalho

Quadro da Câmara Municipal de Cascais

Membro da Comissão de Trabalhadores da CMC

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