“O desempenho das actividades laborais num ambiente seguro e saudável é um factor determinante para o negócio da Lisnave”

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A Lisnave está localizada na zona da Mitrena, em Setúbal. Com uma longa história ao serviço da indústria naval, neste estaleiro são reparados em média 100 navios por ano. Aqui, a segurança é levada muito a sério, assumindo-se como uma das principais prioridades para a organização e gestão de topo. Depois de um exigente processo de auditorias, a Lisnave obteve a sua certificação pela Lloyd´s Register Quality Assurance. Nesta entrevista à Security Magazine, João Calado, health and safety manager da Lisnave, explica que o “estaleiro comporta inúmeros perigos associados a espaços confinados, exposição a produtos químicos, agentes biológicos, radiações ionizantes, trabalhos em altura, trabalhos que envolvem actividades de risco eléctrico de alta, média e baixa tensão, elevação de cargas através de manobras complexas, entre muitos outros riscos”. Este é “um desafio diário para todos os trabalhadores, pois a segurança é da responsabilidade de todos”, diz.

Security Magazine – Qual a importância que a Segurança assume dentro da Lisnave?
João Calado – A Segurança e Saúde no Trabalho (SST) são valores essenciais no desenvolvimento sustentável da organização e constitui uma prioridade estratégica da gestão de topo.

Estou convicto que o desempenho das actividades laborais num ambiente seguro e saudável é um factor determinante para o negócio da Lisnave e restantes Partes Interessadas.

Como está estruturada a vossa segurança e a quem reporta?
O sector de Prevenção de Segurança é composto por duas áreas distintas, nomeadamente a Protecção (Security) e a Segurança (Safety).

A área de Protecção é composta por um responsável que assegura a implementação de procedimentos específicos de protecção contra acções de terrorismo, intrusões, sabotagem, ou outros actos ilícitos em todo o complexo da Instalação Portuária.

A Segurança é constituída por dois especialistas com diferentes responsabilidades, contudo instruídos e estruturados para poderem assumir a totalidade das áreas, nomeadamente a área Operacional, o Suporte Técnico e o Sistema de Gestão de Segurança e Saúde no Trabalho (SGSST).

Estas áreas, são suportadas por uma equipa operacional de Técnicos de Segurança no Trabalho que segue as directrizes do Encarregado e do Coordenador de Equipa.

Como Gestor do Sector de Prevenção e Segurança, reporto directamente a Nuno Antunes dos Santos, engenheiro e administrador delegado da Lisnave.

Quais os grandes desafios em termos de segurança que enfrenta o vosso sector e especificamente a vossa organização?
O maior desafio que enfrentámos nestes últimos anos foi, sem dúvida, o processo de certificação do SGSST de acordo com a norma ISO 45001. Foi um processo que iniciou em Setembro de 2018 e que devido aos constrangimentos associados à COVID-19 ficou suspenso, o qual se retomou em força em 2022.

Após um longo período de preparação, a Lisnave encontra-se certificada pela entidade Lloyd´s Register Quality Assurance e importa salientar que este objectivo foi alcançado em virtude da dedicação e esforço de toda a equipa Lisnave e do suporte incondicional da gestão de topo. Ambos, foram essenciais no alcance deste objectivo tão ambicioso.

Para breve, perspectivam-se outros desafios associados aos novos investimentos no estaleiro, nomeadamente a reciclagem de navios e a produção de equipamentos off-shore.

A área da manutenção e reparação naval é tida como uma das mais desafiantes e perigosas, especialmente para os trabalhadores afectos. Como olha para esta realidade?
Tratando-se de uma actividade industrial, e com o acréscimo significativo de riscos associados ao contexto das actividades de manutenção e reparação naval, bem como as dificuldades sentidas em cada projecto face à diversidade e complexidade dos assuntos envolvidos, torna-se essencial a implementação de um Sistema de Identificação de Perigos e Avaliação de Riscos adequado e bem consolidado.

De forma muito sucinta, o estaleiro comporta inúmeros perigos associados a espaços confinados, exposição a produtos químicos, agentes biológicos, radiações ionizantes, trabalhos em altura, trabalhos que envolvem actividades de risco eléctrico de alta, média e baixa tensão, elevação de cargas através de manobras complexas, entre muitos outros riscos comuns, como os riscos ergonómicos ou psicossociais. Trata-se de um desafio diário para todos os trabalhadores, pois a segurança é da responsabilidade de todos.

João Calado, health and safety manager (centro), com os especialistas de segurança André Ferreira e Tânia Santos nos estaleiros da Lisnave, na Mitrena

Quais os pontos básicos nos quais se baseia a estratégia de Segurança na Lisnave?
Existem alguns pontos estratégicos que suportam o ciclo de melhoria continua da organização para a Segurança e Saúde no Trabalho. Destaca-se o foco em atingir a todo o custo o objectivo de Zero acidentes de trabalho, melhorar continuamente as condições de SST dos trabalhadores da Lisnave e restantes prestadores de serviços, cumprir com os requisitos legais, normas entre outras directrizes associadas à SST, bem como promover o envolvimento de todos os trabalhadores nos aspectos de SST.

Considera importante envolver os trabalhadores nomeadamente no que diz respeito à sua consciência sobre os aspectos de segurança?
Sem dúvida! Trata-se de um aspecto de elevada importância e recentemente com maior foco desde a implementação do SGSST de acordo com a ISO 45001.

A Lisnave tem definido um processo de consulta e participação dos trabalhadores em todos os níveis e funções aplicáveis, através dos representantes dos trabalhadores, suportado pela Comissão de Segurança e Saúde no Trabalho (CSST). Inclusive, o SGSST possui um procedimento específico onde envolve a CSST para o desenvolvimento, planeamento, implementação e avaliação de desempenho, bem como acções de melhoria inerentes à SST.

De certa forma, este procedimento define mecanismos, tempo, formação e os recursos necessários para a consulta e participação, fornece o acesso atempado a informações claras e relevantes, suprime barreiras que possam impedir a participação dos trabalhadores, assim como enfatiza a consulta dos trabalhadores sem funções de gestão.

É necessário salientar que a participação e consulta aos trabalhadores não se cinge apenas às reuniões periódicas com a CSST, existindo desta forma outras acções tais como a envolvência da comissão de aprovação de produtos da Lisnave, participação em auditorias, inspecções e verificações no âmbito de SST, identificação de perigos e avaliação do riscos, inquéritos e questionários.

Focando nesta área, que investimento e avanços estão a fazer para reforçar a vossa segurança (ex. tecnologias, certificações, novos EPI, novas práticas, simulacros, boas práticas….)?
Destaco de imediato a implementação de uma plataforma digital que permitirá gerir em tempo real, o controlo de acessos e respectiva gestão documental associada à SST dos nossos prestadores de serviços.

Prevê-se para breve, um projecto piloto para a desmaterialização do papel inerente à documentação de Segurança, bem como a implementação de um sistema de controlo de ferramentas.

Na área da saúde, está previsto iniciar um estudo envolvendo os exoesqueletos como medida preventiva de Lesões Músculo Esqueléticas Relacionadas com o Trabalho (LMERT), entre muitos outros investimentos e boas práticas em fase de análise.

A Lisnave decorre dos estaleiros da antiga CUF, em Lisboa. Em 1961 foi constituída como Lisnave, ainda em Lisboa. Depois em 1967 passa para Cacilhas, estaleiro desactivado em 2000. O estaleiro na Mitrena, Setúbal foi inaugurado em 1974, com o nome de Setenave. Em 1997 a Lisnave passa para Setúbal, abandonando a construção naval e passando a fazer só reparação naval. Hoje tem uma pequena participação pública de 3%, prepara repara em média 100 navios por ano e conta com volume de negócios de 120 milhões de euros.

Foto: Vítor Gordo, Syncview