O papel das Equipas de Segurança Privada no Regime Geral da Prevenção da Corrupção

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Por Luis Fonseca

O fenómeno da corrupção ofende a essência da democracia e os seus princípios fundamentais, designadamente os da igualdade, transparência, livre concorrência, imparcialidade, legalidade, integridade e a justa redistribuição de riqueza.

O Decreto-Lei 109/E de Dezembro de 2021 tem publicado no seu anexo o Regime Geral da Prevenção da Corrupção (RGPC), que prevê a obrigatoriedade da sua implementação, em todas as organizações dos setores público, privado e social, que tenham mais do que 50 trabalhadores, e nos casos das Autarquias, as que tenham mais do que 10000 habitantes.

O RGPC prevê a nomeação de um responsável pelo cumprimento normativo e instrumentos de combate à fraude e à corrupção, que incluem a implementação de um plano de prevenção de riscos de corrupção e infrações conexas, um código de conduta, um canal de denúncias, a formação e comunicação, procedimentos de controlo interno e procedimentos de avaliação prévia de entidades terceiras. Também estão previstas coimas para a ausência, ou para a ineficiência da implementação deste sistema de conformidade nas organizações.

Qual o impacto e a intervenção das equipas de Segurança na conformidade das organizações com este diploma? O Impacto é enorme e decisivo nas mais diversas vertentes, nomeadamente, na exemplaridade e como intervenientes na operacionalização e vivência da conformidade.

No que respeita ao instrumento do RGPC, canal de denúncias, a Lei n.º 93, de 2021, que estabelece o Regime Geral de Proteção de Denunciantes de Infrações (RGPDI), no ponto n.º 2, do artigo 11º prevê:
2 – No seguimento da denúncia, as entidades obrigadas praticam os atos internos adequados à verificação das alegações aí contidas e, se for caso disso, à cessação da infração denunciada, inclusive através da abertura de um inquérito interno ou da comunicação a autoridade competente para investigação da infração, incluindo as instituições, órgãos ou organismos da União Europeia. 

Entende-se assim, que as organizações devem dotar-se dos recursos necessários para desenvolverem investigações internas dentro dos limites consagrados na Lei. Neste sentido, quando necessário, devem ser formadas pessoas e dotá-las com os meios para assegurar a conformidade com esta Lei. 

Quem nas organizações estará mais apto para conduzir, ou contribuir para estas investigações? 
A Auchan desde 2018, ano em que, por via da Loi Sapin 2, Lei francesa que combate a fraude e a corrupção (similar ao RGPC), sendo uma filial de uma multinacional francesa, teve de implementar a conformidade com esta lei em Portugal.

Neste sentido, foi criada a função de Segurança Económica que integra a Direção Nacional de Segurança da Auchan e que tem a responsabilidade de assegurar a conformidade de vários desses instrumentos, nomeadamente, a pré-avaliação de entidades terceiras, a resposta ao canal de denúncias, a prevenção, deteção e investigação de fraude e a formação, principalmente aos quadros mais expostos à corrupção.

O processo de implementação ofereceu vários desafios que foram ultrapassados, em grande parte, devido ao ecossistema das várias funções e processos já implementados na Direção de Segurança da Auchan, no seu Centro Nacional de Segurança. 

Também foi criada a função de analista de segurança económica, que tem como principais funções:
 Analisar os dados de entidades terceiras: fornecedores de produtos, prestadores de serviços ou outros parceiros. Estes dados têm origem em diferentes fontes internas e externas, em que se incluem sistemas agregadores de bases de dados com informações ao nível internacional. Comparar esses dados com o relatório inicial fornecido pelas entidades terceiras. Detetar anomalias, incluindo as discrepâncias entre a informação fornecida pela entidade terceira e a pesquisada nas diferentes fontes de informação. Elaborar um relatório que é usado para formular um parecer os riscos da relação entre a Auchan e as entidades terceiras, baseado nas análises efetuadas.
 Dar seguimento às denúncias recebidas, efetuando, sempre que necessário, investigações internas.
 No âmbito da prevenção e deteção e investigação de fraude: extrair, preparar e processar os dados provenientes, principalmente dos sistemas de gestão da empresa e reportar as potenciais situações de fraude, usando técnicas e modelos avançados de estatística e de visualização. Efetuar entrevistas de investigação interna e elaborar o relatório com as conclusões da investigação, para responsabilização e melhor conhecimento do método de fraude e o consequente apoio à sua prevenção.
Esta é uma experiência que entendemos ser importante partilharmos, porque pode contribuir para apoiar a implementação do RGPC nas mais diversas organizações, em que as Equipas de Segurança poderão protagonizar funções de relevância, aumentando e valorizando as suas funções, neste caso específico, de segurança de bens.

*Encarregado da Protecção de Dados e Coordenador de Segurança Económica da Auchan Retail Portugal.

** Artigo publicado na última edição especial, exclusiva para profissionais.