A videovigilância veio para ficar. Encontramos câmaras de videovigilância facilmente em lojas de retalho e grandes superfícies comerciais, armazéns e centros de operações, auto-estradas, prisões, espaços públicos, de diversão e lazer, em hotéis, aeroportos, entre muitos outros locais. Estes equipamentos fazem parte das nossas vidas e são cada vez mais as suas valências e capacidades.
O primeiro sistema de videovigilância nasceu há 70 anos, na Alemanha. Porém, a primeira utilização de câmaras de vigilância remonta a 1965, em Nova Iorque, cidade americana que hoje figura entre as que mais equipamentos tem por número de habitantes a nível global. Inicialmente sem possibilidade de gravação, sendo necessária a monitorização constante, as câmaras eram bastante rudimentares no que toca à qualidade de imagem face à realidade actual. Já nos anos 70, o mercado passa a contar com câmaras com capacidade de gravação em cassetes de vídeo, permitindo um registo e consulta posterior.
Ao longo dos anos, assim como o que aconteceu com outros equipamentos, também estas conheceram mais avanços tecnológicos. Na década de 90, por exemplo, já existia um sistema único com capacidade de gravação de imagens de várias câmaras simultaneamente, podendo ser armazenadas em discos rígidos. Mais tarde surgiram câmaras IP (Internet Protocol), com a particularidade de permitirem a monitorização remota via um domínio IP, a que se seguiram muitas outras evoluções.
Numa área em que muito se evoluiu em termos de qualidade e fiabilidade da imagem, mesmo em ambientes mais extremos, hoje, falar de videovigilância é falar de outras tantas aplicações e desenvolvimentos que tornam estes equipamentos muito mais capacitados e com valências mais amplas que vão muito além da simples captação de imagem.
A videovigilância anda de mãos dadas com a Inteligência Artificial, IoT, AIoT (da união entre Inteligência Artificial e Internet das Coisas – IoT), deep learning, cloud, big data e analítica. E, à semelhança dos smartphones que hoje vão muito além da mera chamada telefónica, também as câmaras de videovigilância tem somado aplicações, funcionalidades e capacidades.
Crescimento continuado
A Security Magazine foi saber o que quatro grandes fabricantes de equipamentos de videovigilância andam a fazer nesta matéria, quais são as principais tendências e como está o estado do mercado português.
No caso da Bosch, a par dos indicadores globais para o mercado da videovigilância, que apontam para um continuo crescimento, Norberto Barroca, director de vendas em Portugal para a área de Building Technologies da Bosch, confirma esta tendência no mercado nacional, embora de forma mais moderada. Como refere, a previsão indica que “o mercado nacional deverá crescer a um ritmo de 3% até 2025, bastante abaixo do crescimento mundial”. “Não obstante, a área de negócio de videovigilância para a Bosch no ano de 2021 teve crescimentos acentuados, acima dos dois dígitos e superou as nossas melhores expectativas”. Quanto a 2022, “continuamos com ritmos de crescimento elevados e bastante acima da média de mercado, com uma carteira bastante sólida de projectos a finalizar ainda este ano”.
À margem do recente evento da Axis, em Lisboa, Ricardo Pereira, Portugal sales manager da Axis, adianta à Security Magazine que o mercado português se tem “mostrado espectacular para a Axis”, sendo que a empresa regista um crescimento significativo nos últimos anos. “A pandemia criou aquela contenção, mais relacionada com a confiança do mercado do que com oportunidades de negócio, as quais continuaram a existir”, disse.
Também Chenzhi Zhu, CEO da Dahua Iberia, confirma a tendência de crescimento, muito marcado por novos desenvolvimentos. “Com o desenvolvimento e aplicação da IA, IoT, computação em nuvem e big data, etc, a tecnologia de vídeo inteligente continua a mostrar maior valor no processo de transformação digital na era pós-pandémica. O mercado de IoT inteligente centrado no vídeo expande-se ainda mais”, afirma. Para o responsável, com novas exigências a continuar a surgir e a constante aceleração da actualização e integração de novas tecnologias, “a exploração, acumulação e investimento em inovação de I&D e novas tecnologias têm-se tornado cada vez mais importantes”, sublinha. Contudo, destaca que “a fragmentação e personalização do mercado determinaram que o crescimento em escala de transformação e actualização inteligente é um processo de penetração contínua”.
Para o Portugal Regional Sales Manager da Hikvision, Bruno Bento, o último ano foi de recuperação pós-covid, tendo-se assistido ao “retomar de projectos adiados em 2020 pelos confinamentos”. Já este ano, “assiste-se ao surgimento de novos projectos, inovadores e diferenciadores, o que poderá perspectivar uma tendência de continuidade nesta recuperação, mas «ameaçada» pelo clima político-económico internacional conturbado que, face ao continuo aumento de custos de matérias-primas, energia, transportes, etc, poderá inverter nesta dinâmica”.
Mercado português segue tendências internacionais
O mercado português de videovigilância “está segmentado em três grandes áreas – soluções específicas para verticais (indústria, infra-estruturas críticas e retalho); soluções AIoT com analítica de vídeo; e câmaras IP com alta resolução”, esclarece Norberto Barroca. Nestes três segmentos, “as soluções AIoT com analítica de vídeo são claramente as que têm uma maior procura e onde a Bosch é líder de mercado”, diz.
Já Ricardo Mendes , Key Account Manager de Desenvolvimento de Negócios na Dahua Iberia, salienta que “o mercado português, apesar de ser bastante conservador e regulado, está a mudar com sinais positivos, – possivelmente derivados dos novos tempos e do nível de formação dos profissionais”. Como aponta, é um mercado dominado por alguns actores com “dimensão importante que se destacam com uma vasta carteira de serviços/produtos”. Esta estratégia “de longa data, não centrada no valor ou diferenciação de serviços e produtos, significa que, na maioria dos casos, a competitividade é avaliada apenas no factor «preço» e este torna-se um factor chave”.
Também Bruno Bento, da Hikvision, destaca o crescimento no mercado português de videovigilância, “embora com segmentos bem distintos”. Como afirma, por um lado, há um maior foco no preço mais competitivo com gamas baixas/médias e, por outro, assiste-se à procura de soluções IoT, analíticas e para mercados verticais. “A instabilidade económica e a tendência de mercado para um preço baixo faz com que muitos fabricantes sigam com uma política de gamas baixas e competitivas para fazer face à enorme concorrência nesse segmento de mercado”. Contrariamente a isso, diz, “alguns fabricantes, aproveitando a rápida evolução tecnológica, desenvolvimento de analíticas e acompanhando a cada vez maior procura de soluções IoT, posicionam-se num segmento de mercado diferenciador e superior. É, neste último segmento de mercado, que a Hikvision, não descurando o outro, está posicionada”.
Capacidades analíticas são valorizadas
“Num país como Portugal, onde os orçamentos são limitados temos de ajudar os nossos clientes a trabalhar com essa realidade”, afirma Ricardo Pereira, da Axis. Essa ajuda assenta sobretudo numa optimização dos custos associados ao investimento nestes produtos/dispositivos. Os clientes procuram “fiabilidade e capacidade de escalabilidade”, diz. Ricardo Pereira considera que o mercado português de videovigilância “maturou bastante” e, apesar de as próprias analíticas terem limitações, os clientes “procuram encontrar soluções fiáveis e que tenham provas dadas no mercado”.
Para o responsável, o campo das analíticas é o que tem tido uma maior evolução, a qual classifica como “galopante”. Como aponta, a empresa conseguiu “criar uma estratégia de abordar vários mercados e segmentos sem estar extremamente focada em apenas um, porque o nosso portfolio permite-nos isso”. Em termos de sectores, o retalho, as infra-estruturas críticas e a indústria são os que têm maior relevância para a empresa.
Actualmente, na hora de escolherem um produto, Bruno Bento acredita que o cliente se foca na qualidade, funcionalidade, robustez e capacidade analítica dos produtos.
Já Norberto Barroca destaca que os clientes valorizam essencialmente “o suporte e acompanhamento dado pelo fabricante; a fiabilidade e robustez; e o local de produção dos equipamentos”. Com sublinha, “o facto de termos uma fábrica de videovigilância em Portugal, numa situação mundial em que as cadeias de abastecimento, nomeadamente de chips, têm provocado sérios constrangimentos na entrega de produtos aos clientes finais, tem-nos permitido ser mais ágeis que a nossa concorrência”.
O responsável destaca também a questão da cibersegurança. Hoje os clientes finais procuram “mecanismos que permitam elevadíssimos níveis de protecção contra ciberataques”. Como sublinha, “as soluções que não garantam a confidencialidade, desempenho, durabilidade e segurança por design serão insustentáveis no curto e médio prazo, dado que estes dispositivos podem ser controlados remotamente e no caso da videovigilância os cibercriminosos vendem o acesso às câmaras de vigilância”. O responsável recorda que “um estudo da Cyfirma indica que mais de 80 mil câmaras de vigilância de um único fabricante foram expostas a ciberataques com uma criticidade de 9.8 em 10”.
Sobre o tema da cibersegurança, Pedro Alfaro, sales Engineering & Training Regional Manager, Southern Europe da Axis, sublinha que a cibersegurança está na estratégia da Axis há muitos anos. “Temos uma estratégia base há mais de 30 anos, sendo que tudo o que é desenhado tem a cibersegurança by design e só depois são adicionadas competências de software e hardware”.
De produtos a soluções integradas
E, se as câmaras têm avançado em capacidades, é natural que os clientes procurem mais soluções do que produtos. Pedro Alfaro salienta que o mercado tem cada vez mais interesse em soluções integradas. “Os clientes procuram não apenas a videovigilância, mas também o controlo de acessos integrado por vídeo, pensando em segurança, operações, gestão de pessoas e veículos”. diz. Num mercado em constante evolução, a inovação é fundamental. “A inovação é metade da estrutura da empresa, a qual está dedicada ao desenvolvimento e investigação”, refere. Hoje nota que se assiste a diferentes tecnologias a trabalhar de forma inesperada em conjunto, dando como exemplo o radar ou o áudio que podem trabalhar conjuntamente com uma câmara.
Também o responsável da Dahua considera que os clientes passaram a focar-se mais na solução do que no produto. “Os clientes já não se contentam com dispositivos com uma só câmara para supervisionar cenas. Em vez disso, exigem um sistema completo que os ajude a melhorar a eficácia das suas operações e mitigar possíveis riscos”.
Futuro é desafiante
No que toca às principais tendências deste mercado, Bruno Bento acredita que a videovigilância será utilizada não apenas para o security, mas também como “uma ferramenta que permite melhorar a operacionalidade da instituição e a qualidade de vida”. Neste sentido, e como já mencionado, “podemos considerar que uma câmara é cada vez mais um device que, além da imagem, permite a utilização de analíticas que geram uma enorme quantidade de metadados, utilizados para outras aplicações”.
Norberto Barroca destaca que “a introdução de novas tecnologias e sistemas, altamente avançados, de inteligência artificial abrem um novo leque de oportunidades que, até então, não existia”. Assim, as tendências dos próximos anos passam por “soluções avançadas de IA, onde alguns sistemas serão capazes de prever alguns tipos de acontecimentos”, através daquilo que se chama analítica preditiva. Além disso, aponta que com os avanços tecnológicos do hardware e da conectividade “existe uma tendência de aparecimento de soluções na cloud e a remoção de equipamentos físicos das instalações dos clientes”. Como salienta, “uma das soluções que mais tem crescido neste sector é a gravação do vídeo e metadados na cloud, em detrimento de soluções de gravação local que, muitas vezes, se traduzem em elevados custos de manutenção e sem qualquer tipo de redundância”.
De facto, a IA está na mira do mercado de videovigilância. “A procura de IA disparou nos últimos anos e espera-se que assim continue em 2022”, diz o responsável Chenzhi Zhu. Como aponta, “cada vez mais dispositivos baseados em IA serão amplamente aplicados em campos relacionados e em várias indústrias. Com a evolução da tecnologia da IA, a análise baseada na IA será gradualmente aplicada a produtos de gama baixa, e a experiência do utilizador será significativamente melhorada. Com o rápido desenvolvimento da IA, big data, da IOT e de outras tecnologias digitais, a sociedade humana entrou na era digital”. No futuro, “a digitalização e a inteligência continuarão a impulsionar o desenvolvimento sustentável e de alta qualidade de toda a sociedade. A transformação digital inteligente tornou-se o tema principal da época”, conclui o responsável.
Ricardo Pereira salienta que o mercado tem sido muito alavancado pelas analíticas de vídeo. Nesse sentido, a empresa continua a sua aposta na capacidade de processamento on the edge, ou seja, as analíticas no dispositivo. “Estamos a renovar toda a nossa gama de produtos e a lançar novos produtos com capacidade deep learning no dispositivo porque esse tem sido um pedido dos nossos clientes”. Mais do que a imagem, “os clientes hoje querem perceber algo mais”, ou seja, ter acesso a mais dados e informação e capacidades, nomeadamente, o número de pessoas a circular em determinado lugar, por exemplo.
Quanto a novidades recentes, o responsável da Hikvision destaca “o desenvolvimento de tecnologia termográfica certificada para detecção de incêndios, evolução da tecnologia ColorVu X para locais com muito pouca iluminação e, também a pensar na eficiência energética, a gama de câmaras alimentadas por energia solar, assim como a tecnologia inovadora de câmaras panorâmicas TadenVu, entre muitas outras”.
Já a Bosch apresentou recentemente ao mercado nacional uma nova série de produtos. Norberto Barroca destaca, por exemplo, as novas câmaras móveis MIC e AUTODOME inteox 7100i OC disponíveis nas versões 1080p e 8MP, que além de permitirem a instalação de apps para detecção de fumo e fogo e inundações, utilização de EPIs e muitas outras, não necessitam de calibração adicional para obtenção de metadados de analítica. Nas próximas semanas a empresa irá apresentar as novas câmaras DINION 7000i IR disponíveis nas versões 1080p, 4MP e 8MP que permitem distâncias de IRs superiores a 120m. Finalmente, muito em breve, “iremos introduzir a nossa solução de gravação na cloud com filtragem inteligente de eventos que possibilita uma rápida pesquisa de incidentes em tempo real”, avança. Para o responsável, a vantagem da utilização da solução da Bosch é que” não é necessário nenhum hardware adicional para além das câmaras para a realização de gravação contínua na cloud, o que reduz drasticamente os custos em termos de equipamentos e manutenção para o cliente final”.
No caso da Dahua, Ricardo Mendes destaca que três tecnologias mais importantes encontradas nos equipamentos da marca: Full-color, TiOC 2.0, Smart Dual Illuminators, as quais permitem às câmaras gravar onde é mais necessário com imagens a cores de alta resolução, mesmo em condições de pouca luz.
Num estudo, lançado no início do ano, a Axis destacou seis tendências tecnológicas que marcam o sector da segurança este ano, sendo de destacar o caminho para “um mundo mais inteligente e seguro”, sublinhado por uma ligação universal em ambientes híbridos; a cibersegurança; a autenticação da ligação dos dispositivos e aplicações e a IA.
Uma imagem vale mais que mil palavras
A ter em conta as observações dos principais fabricantes de videovigilância a nível mundial, não há espaço para dúvidas – uma imagem vale, de facto, mais que mil palavras. Estes equipamentos são vistos como um verdadeiro auxílio à segurança física, permitindo libertar a componente humana para outras tarefas igualmente exigentes e, simultaneamente, actuar como elementos dissuasores, possibilitando, cada vez mais, a rápida detecção e identificação de situações suspeitas ou a emissão rápida de alertas em tempo real.
Conjugadas com outras tecnologias, as câmaras vão mais além da mera função de captação de imagens, podendo ser um auxílio importante aos departamentos de marketing, por exemplo, por permitirem conjugar uma série de outras aplicações num único equipamento.
A oferta no mercado nacional é ampla e a escolha recai cada vez mais sobre a possibilidade de integração, escalabilidade, segurança, robustez e fiabilidade. Com os custos energéticos a pesarem fortemente na factura mensal das organizações, estima-se que a questão preço seja também, cada vez mais, valorizada na hora de escolher um produto desta tipologia, atendendo simultaneamente aos custos de instalação e manutenção dos equipamentos.
Os próximos anos, prometem ser de crescimento para a indústria de videovigilância, ainda que sob a incerteza dos custos das matérias-primas e disponibilidade de alguns componentes, acompanhada pela instabilidade política e económica global.
O mercado europeu de sistemas de videovigilância deverá crescer até 15,5% até 2027, aponta alguns estudos internacionais. Sendo que a Europa assume-se como um dos principais mercados a mostrar uma maior adopção de sistemas de videovigilância devido às crescentes preocupações com segurança. O mercado está a ser impulsionado pelo aumento das despesas em IT, segurança e outras iniciativas governamentais para a procura de sistemas de segurança mais avançados na região.
Se gosta desta notícia, subscreva gratuitamente a newsletter da Security Magazine e receba informações como esta no seu email.